Romance em Cordelaranja – João Paulo Hergesel

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Romance em Cordelaranja é um cordel premiado no Concurso Literário de Barueri, em 2011, e selecionado no 6.º Concurso Literário de Itaporanga-PB, em 2017.

Começo em “era uma vez”

Essa história de Qiü Jia,

Descendente de chinês

Que morava na Bahia

E que, em toda sexta-feira,

Vende laranjas na feira

Para ajudar a família.

 

Com seu típico bigode

E sua pele amarelada,

Jamais amarrava o bode;

Tinha a risada estampada.

Vinte e dois anos de vida

E a simpatia contida,

Atraía a mulherada.

 

Na barraquinha da frente,

Moça de nome Apuana

(De indígena, descendente,

Mas soteropolitana)

Vendia abóboras boas

Que agradavam as pessoas

Pelo seu sabor bacana.

 

Toda sexta, tinha gana,

Portanto, ele anunciava:

— Seleta, lima, baiana…

(Da baiana, ele gostava)

— Tudo, tudo baratinho

E com sabor bem docinho

Para donzela ou escrava!

 

 

Também nesta mesma feira,

Ela, logo na subida,

Vendia de tais maneiras:

Assada, frita ou cozida.

Tinha abobrinha e moranga

Praquele que não se zanga

Porque saboreia a vida.

 

Esta jovem e este moço

São casal por natureza.

Ela, oferecendo o almoço;

Ele, dando a sobremesa.

Abóboras e laranjas:

Felicidade se esbanja!

Até que houve uma peleja.

 

O chinês quis divulgar

Uma receita mineira:

— No forno, vamos assar

Pato com laranja-pera!

Nisso, a abóbora perdeu,

Pois ao povo apeteceu

Essa mistura maneira.

 

Possessíssima de raiva,

Pele-vermelha estressou.

Ousada que nem saraiva,

Uma delícia inventou:

— Provem do doce de abóbora,

Pois garanto que não sobra

De gostoso que ficou.

 

 

 

Os fregueses não sabiam

De quem ou o que comprar

Se abóbora consumiam

Ou laranja, no jantar.

Deu-se, assim, a grande briga

Entre o amigo e sua amiga

Que passaram a se odiar.

 

Qiü Jia teve a batuta

Oferta comercial

Para ir vender suas frutas

Lá do lado oriental.

Tomou logo a decisão:

Embarcou num avião

De voo internacional.

 

Salvo a cesta de legumes,

Apuana está sozinha.

“Sem a faca de dois gumes,

Não se corta uma abobrinha.”

Dessa forma, a freguesia,

Sem ter opção, preferia

Comprar quilos de farinha.

 

E os negócios iam mal

Com as laranjas na China.

Não gostavam, nem com sal,

Mandaram pra Cochinchina.

Preso no Inferno de Dante,

Pensou: “Neste mesmo instante,

Volto pra minha menina!”

 

 

Acredite: houve até canja

Para o encontro entre esses dois.

Romance cor-de-laranja,

Protagonizaram, pois,

A indiazinha e o chinês.

No lugar de “era uma vez”,

É melhor: “uma vez foi”.

João Paulo Hergesel
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