Felipe Medelo – Aluno do curso de Direito
Em 05 de Outubro de 1988 o Brasil exaltava alegria, surgia “nossa mãe”, estava sendo promulgada a Constituição Federal da República. Existia esperança de dias melhores, um grande leque de direitos fundamentais foi assegurado, tudo parecia caminhar para a evolução. Entretanto, não passou de mera utopia imaginar um Brasil que clamasse por todos, onde não houvesse discriminação de cor, credo, sexo, classe social, etc. Na realidade, o que houve foi a criação de três poderes – Legislativo, Executivo e Judiciário -, ou melhor, a criação de “três filhos ingratos”, que deveriam lutar por nosso país, mas na verdade lutam apenas por seus próprios interesses.
Dilma Rousseff e Michael Temer, ótimos nomes para demonstrar a situação mórbida do Poder Executivo. A ex-presidente chegou ao cargo como um exemplo a ser seguido por toda sociedade, lutou contra a ditadura, venceu os preconceitos, e alcançou uma posição de extremo prestígio. Infelizmente com o decorrer dos anos mostrou-se uma pessoa contraditória, uma vez que alcançou a reeleição com propostas enganosas, tomando atitudes diferentes das quais havia prometido durante a campanha, como por exemplo, a alteração em direitos trabalhistas, gerando uma indignação no povo e consequentemente a perda do apoio popular, resultado assim, em um conturbado impeachment.
Já o atual presidente gozava de uma boa reputação, um cidadão bem instruído, autor de livro, um grande professor de Direito Constitucional. Contudo, infeliz foi aquele que acreditou que este homem tinha boas intenções, bastou pouco tempo para verificar seus reais objetivos. De forma arbitrária instituiu a medida provisória da reforma do ensino médio, não buscou ouvir as opiniões dos estudantes, isto é, os maiores interessados. Elaborou também a proposta de emenda constitucional que congela os gastos públicos por um período de vinte anos, tendo a plena consciência da inconstitucionalidade e a negando de forma sarcástica, pouco se importando com os efeitos que tal dispositivo causará na educação e na saúde. Podemos ainda citar como exemplo de seu desleixo com o povo brasileiro, a reforma da previdência proposta há poucos dias, onde se elide o princípio da isonomia presente em nossa constituição, e expressa na seguinte frase de Aristóteles: “tratamento igual aos iguais e desigual aos desiguais, na medida dessa desigualdade”, uma vez que o atual projeto não leva em consideração as particularidades de algumas profissões que necessitam de regras diferenciadas.
Poder legislativo, sem dúvidas o mais criticado pela sociedade, um lugar onde não se mede esforços para garantir benefício a si próprio, mesmo que custe a dignidade do país. O Presidente do senado demonstrou total desrespeito com a República Federativa do Brasil. Renan Calheiros simplesmente negou-se a cumprir uma ordem judicial expedida pela suprema corte, e não sofreu consequências por tal atitude, com isso, deixou clara a ideia de que tal Poder não se sujeita ao contrato social estabelecido por todos os brasileiros.
O Ministério Público Federal com um abaixo assinado de mais de dois milhões de assinaturas, enviou ao congresso um projeto de lei que visa a criação de dez medidas contra a corrupção, algumas, sem dúvida, exageradas, sendo uma a permissão de provas ilícitas quando adquiridas de boá fé. É evidente o perigo que isto poderia gerar, afinal seriam aceitáveis torturas, invasões domiciliares pelos policiais, desde que encontrassem provas. Dessa forma esperava-se que o congresso agisse de forma coerente, retirando os excessos presentes em tal proposta. Todavia, não foi isso que ocorreu, modificou em grande parte tal projeto para auferir vantagens pessoais, criando um dispositivo que limita a atuação do poder judiciário e do Ministério Público, por exemplo, um juiz que condena um réu em primeira instância poderá ser punido caso o Tribunal de Justiça tenha um entendimento contrário e absolva o réu.
Todas essas turbulências e manobras refletem em um povo desacreditado com a política, tanto que nas eleições municipais deste ano, em várias cidades houve mais votos nulos, brancos e abstenções em relação a quantidade de votos obtidos pelos candidatos eleitos. Esse fato nos leva a necessidade de uma reflexão histórica: na Grécia Antiga, o indivíduo que se preocupava apenas com seus próprios interesses, que não se importava com os anseios da sociedade, era chamado de idiota, já seu oposto, isto é, aquele que buscava o bem comum, lutava pelos interesses da coletividade, era chamado de político. É cômico, mas em nossa sociedade a palavra “político” tomou um sentido contrário do qual receberá em princípio.
Último “filho” a ser apresentado, Poder Judiciário, talvez o que goze de um maior respeito pelos cidadãos, visto que tem a função de fazer justiça, zelar pelos dispositivos legais de nosso país, mas que ultimamente vem se politizando e consequentemente começando a perder sua coerência. O juiz federal Sergio Moro, enaltecido pela sociedade, sem dúvidas está realizando um trabalho fantástico na operação lava jato, fazendo grandes empresários e influentes políticos responderem por seus atos de forma justa, sem privilégios. Contudo, uma foto divulgada há poucos dias onde o juiz aparece conversando de forma descontraída com o senador Aécio Neves, que já foi citado na operação Lava Jato, fez povo brasileiro ficar em dúvida em relação aos reais interesses. Estaria ele lutando por um Brasil melhor ou simplesmente vislumbrando vantagens em um futuro governo presidencial de tal senador, como por exemplo, uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF)? Afinal por enquanto ele só agiu de forma enérgica em relação à oposição do partido do senador em questão.
Há pouco tempo o STF permitiu a prisão do indivíduo condenado em segunda instância, mesmo que não tenha esgotado todas suas possibilidades de recurso, ou seja, um indivíduo que pratique uma conduta ilícita e ainda não tenha uma sentença condenatória transitada em julgado poderá ser privado de sua liberdade, entendimento esse inconstitucional, pois o Art. 5, LVII assegura o direito de ninguém ser considerado culpado até o trânsito em julgado. Confesso que a princípio fiquei feliz com tal posicionamento da suprema corte, já que aparentemente desdobrava-se como algo justo. No entanto, com uma análise mais minuciosa foi possível perceber o tamanho da gravidade da decisão tomada pelos ministros, uma vez que abre portas para diversas outras violações constitucionais. Acredito que tal decisão foi tomada de forma estratégica, uma vez que a população gostou, e de forma inconsciente acabou aceitando tal violação, abrindo dessa forma, diversas outras possibilidades para o STF “começar a legislar”, como já fez em relação ao aborto, e fará em outras oportunidades que forem de seu interesse.
Nosso país, portanto, encontra-se a mercê dos “três filhos ingratos”, que deveriam trabalhar de forma harmônica entre si para promover o bem estar da coletividade, contudo, o que realmente ocorre são ações buscando interesses particulares, declaram guerra entre si, e logo depois reatam a relação quando têm anseios em comum. É claro, anseios esses que na maioria das vezes não representam os do povo brasileiro.
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